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Centenas de magistrados fora do mapa

tribunalO projecto do Ministério da Justiça que estabelece as regras para a nova organização dos tribunais judiciais - conhecida como mapa judiciário -, revelada esta terça-feira, deixa de fora dos respectivos quadros entre 91 a 226 juízes e 150 a 250 procuradores da República, segundo a análise já efectuada pelas organizações sindicais das duas magistraturas.

Isto quer dizer que centenas de magistrados actualmente em funções ficarão de um dia para o outro sem colocação certa e os respectivos tribunais em risco de aumentarem os processos pendentes.

O projecto do Governo estabelece para cada tribunal números mínimos e máximos de magistrados. As contas da Associação Sindical dos Juízes Portugueses (ASJP) e do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público (SMMP) são feitas com base nos que estão actualmente em funções. “Para Lisboa, prevêem-se menos 11 a 42 juízes face aos que existem neste momento. No Porto são menos 22 a 39, em Leiria menos 13 a 24, em Santarém menos 12 a 16 e em Faro menos 11 a 15”, explica Mouraz Lopes, presidente da ASJP, salientando que se trata de comarcas com elevado número de processos pendentes: “Não se podem diminuir pendências diminuindo o número de juízes, nomeadamente nos tribunais onde o congestionamento processual é maior”.

E, na capital, dá o exemplo do Tribunal do Comércio, onde são milhares as acções de falência: neste momento há 13 juízes (quatro efectivos e nove auxiliares), prevendo-se que venha a ter um quadro de apenas três.

O projecto não dá destino a esses magistrados, apenas refere no preâmbulo o objectivo de “simplificação na afectação e mobilidade dos recursos humanos”. Mas, tendo em conta a lei-quadro, publicada em Agosto, que prevê a criação de bolsas de juízes e de procuradores da República por grupos de comarcas, especula-se que esses magistrados poderão, após concurso nacional, ficar adstritos a elas - e assim disponíveis para serem destacados para substituir colegas do quadro ou reforçar tribunais consoante o volume processual.

'Afronta aos juízes'

“É uma afronta aos juízes que trabalham nos tribunais”, diz a ASJP. “Às pressões sobre os tribunais, ao desrespeito pelas suas decisões, à degradação fortíssima do sistema remuneratório, acresce agora a incerteza e precariedade do trabalho dos juízes. Há limites para tudo”, salienta-se.

Também Rui Cardoso, presidente do SMMP, diz que não se compreende a base estatística - nomeadamente, o volume processual - a que o Ministério da Justiça recorreu para fixar o número de magistrados a afectar. A ministra da Justiça, Paula Teixeira da Cruz, já salientou que se trata de um anteprojecto, sujeito a alterações e a debate.

Ambas as organizações prometem contestação: “Vamos demonstrar que isto não tem qualquer correspondência com a realidade das necessidades dos tribunais”, diz Mouraz Lopes. Rui Cardoso aponta ainda outros problemas - como o da norma que prevê que os procuradores da República que fazem os inquéritos-crime e as acusações acompanhem depois o respectivo julgamento: “É um absurdo, pois os quadros não dão para isso. Além disso, é algo que tem de se discutir se é desejável”.

O mapa judiciário é mais um motivo de desagrado no sector, a juntar-se aos novos cortes salariais previstos no Orçamento do Estado para 2014. “Há um grande mal-estar neste momento”, diz Mouraz Lopes. Para discutir tudo isto e decidir eventuais medidas de protesto, o SMMP e a ASJP marcaram para dia 2 e 9 de Novembro, respectivamente, assembleias-gerais extraordinárias. “Vou muito preocupado”, diz Mouraz Lopes.

Prevê-se que a instalação do novo mapa judiciário arranque a 1 de Janeiro próximo, sendo que o funcionamento em pleno só deverá acontecer depois do Verão. Será preciso, entretanto, desencadear os mecanismos para pôr em marcha as mudanças de funcionários, magistrados e processos. Para isso, os conselhos superiores das magistraturas terão de realizar mega-movimentos extraordinários, envolvendo o total de juízes (1.400) juízes e procuradores da República (1.500).

Vantagens e problemas

Depois de muita discussão com operadores judiciários e autarquias, o Ministério opta por encerrar 22 tribunais e reduzir 25 a 'secções de proximidade' (com um quadro de funcionários, onde poderão ser entregues documentos e feitas diligências).

Cada distrito constituirá uma comarca, sendo que o tribunal da capital de distrito julgará os processos de crimes mais graves e as acções de maior valor (superiores a 50 mil euros) relativos a toda a sua área geográfica, tendo também secções especializadas (Trabalho, Família e Menores, etc.). Dentro do distrito haverá, na maioria dos concelhos, tribunais de competência genérica local (acções de menor valor e crimes menos graves), sendo que alguns terão também secções especializadas em certas áreas.

Todos os processos em curso terão de ser redistribuídos, consoante a sua origem territorial. No distrito de Faro, por exemplo, um crime de homicídio qualificado ocorrido no concelho de Lagos, e que actualmente tem de ser julgado neste tribunal, com o novo mapa o julgamento terá de ser feito no tribunal de Portimão. Outro exemplo: todos os tribunais do distrito de Faro podem resolver acções de falência; com o novo mapa, uma falência ocorrida em Vila do Bispo (que agora é julgada no tribunal de Lagos) obrigará os trabalhadores a ir a Olhão, onde fica sediado o único Tribunal de Comércio do distrito, mas cujos magistrados apenas julgarão este tipo de acções.

“O novo mapa tem esta vantagem de especializar os tribunais consoante o tipo de processos, mas cria nalguns casos um problema de deslocação às populações”, comenta um magistrado, apontando também, por outro lado, o risco de se concentrar de repente as acções mais complexas nos tribunais das capitais de distrito, que “podem ficar afundados”.

in SOL | 26-10-2013 | Ana Paula Azevedo

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