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Código Penal. Saiba tudo o que muda. Cuidado com as mentiras e as amnésias
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- Criado em 22-01-2013
A partir de agora é melhor pensar não duas, mas três vezes, antes de mentir, se não quer ter (mais) problemas com a justiça.
Em tribunal, esqueça as amnésias: quem confessou nas fases preliminares do processo já não ganha nada em dizer que não se lembra. Mentir ao notário ou na repartição de Finanças passa a ser punido com multa ou prisão até um ano. Os casos de sem-abrigo que roubam sabonetes de 50 cêntimos e estão a responder em tribunal também devem aparecer com menos frequência nos telejornais: agora só chegam a julgamento se o super ou hipermercado arcar com as custas (superiores ao preço do sabonete). Para os condutores apanhados com álcool acabaram-se os perdões: mesmo que seja a primeira vez vão ter de se sentar no banco dos réus. A tutela promete com os novos códigos Penal e de Processo Penal maior rapidez e menos espaço para manobras: arguidos apanhados em flagrante delito devem começar a ser julgados até 20 dias depois e os recursos atrás de recursos têm os dias contados.
Pouca tolerância para mentiras e amnésia
Chegar ao pé do juiz com a conversa de que “já não me lembro do que se passou” ou “não foi bem isso o que disse aos inspectores” poderá ser mais difícil com as mudanças no Código de Processo Penal. Tudo o que for dito pelos arguidos durante a investigação
vai poder ser usado em tribunal, desde que o seu defensor esteja presente. Se, por exemplo, durante as fases preliminares do processo o suspeito admitir que cometeu o crime, não há volta a dar: a confissão é usada como prova. A regra tem como objectivo evitar que os arguidos contrariem os depoimentos anteriores para tentar escapar à condenação porque as provas materiais são insuficientes para os condenar. O princípio também se aplica às testemunhas. Caso estejam em paradeiro incerto e não seja possível a sua presença em tribunal, os testemunhos anteriores prestados na fase de inquérito passam a servir de prova em julgamento. E mesmo que compareçam em tribunal, não valerá a pena investir em versões diferentes. Regra geral, o que está dito está dito.
Juiz de instrução ganha mais poderes
Lembra-se de ler que Duarte Lima saiu de prisão preventiva apesar de o juiz Carlos Alexandre discordar da alteração da medida de coacção? Não percebeu porque assina o juiz despachos com ordens com as quais não concorda? Este cenário vai mudar. Agora, durante o inquérito, o juiz já vai poder aplicar uma medida de coacção diferente daquela que foi pedida pelo MP desde que se verifique perigo de fuga, perigo de continuação da actividade criminosa ou perturbação da ordem pública. O caso muda de figura se o MP fundamentar perigo de perturbação do inquérito:
aí o juiz volta a perder poderes.
Apanhados em flagrante em julgamento supersónico
Suspeitos apanhados em flagrante vão ser julgados de imediato. Nunca será de um dia para o outro, mas levarão no máximo até quatro meses a conhecer a sentença. Em quase todo o tipo de crimes (à excepção, por exemplo, do tráfico de armas ou de droga),
desde que o suspeito seja apanhado no acto, passa a estar sujeito ao chamado processo sumário – que deve começar no prazo de 20 dias e terminar no prazo de 120. Até à aprovação do novo código os julgamentos rápidos só se aplicavam aos crimes punidos com menos de cinco anos de prisão ou quando o MP concordava antecipadamente que a pena não seria maior. Agora o catálogo de crimes até inclui os homicídios.
Detidos nos calabouços até 48 horas
Os apanhados com a boca na botija, que é como quem diz, em flagrante delito, deixam de poder aguardar em liberdade o julgamento, seja numa condução sem carta seja num homicídio. O suspeito deve permanecer detido na esquadra ou nos calabouços de um tribunal até ser presente ao Ministério Público. Caberá então ao MP decidir se avança para julgamento sumário (no espaço de 48 horas) ou se aplica a medida de coacção. O Ministério da Justiça entende ainda que, “em especial em situações de condução sem carta ou sob o efeito do álcool”, a detenção até à apresentação num juízo se revela “potencialmente dissuasora da prática” desse tipo de crimes.
Julgamentos mais rápidos e recursos mais limitados
A possibilidade de recorrer para o Supremo Tribunal de Justiça ficou mais limitada. Passam a subir apenas recursos de crimes mais graves, ficando de fora aqueles cujas penas são muito leves e até aqui entupiam esses tribunais. Sempre que a Relação decide aplicar pena de multa ou de prisão não superior a cinco anos, o arguido deixa de poder recorrer para o Supremo. Deixa também de ser possível recorrer sempre que um acórdão da Relação absolva o arguido, quando a primeira instância o condenou a pena de multa ou prisão até cinco anos.
Não compensa provocar imbróglios jurídicos
A partir da primeira condenação, o procedimento criminal já não pode prescrever. Por mais recursos que os advogados venham a usar para arrastar o processo.
O arguido previamente condenado pode continuar a interpor recursos, mas se a ideia é gastar fortunas para no final o processo prescrever o trunfo deixa de funcionar. O que aconteceu, por exemplo, com o presidente da Câmara de Oeiras nunca poderia ocorrer se estas novas regras já estivessem a vigorar. Em Maio de 2012, Isaltino Morais não pôde ser condenado por corrupção no processo das contas da Suíça, apesar de este crime ter ficado provado quando foi julgado, em Julho de 2010. Porquê? O processo prescreveu.
Perícias têm de ser bem detalhadas
Sempre que o MP ou o órgão de polícia criminal solicitar uma perícia vai ter de explicar muito bem o que pretende. Não basta, por exemplo, pedir para examinar documentos sem especificar quais são os objectivos. Se a finalidade for analisar a caligrafia, isso terá de ficar expresso. Se o que pretendem é também recolher impressões digitais, essa diligência deverá igualmente constar no pedido. Todas as questões a que os peritos têm de responder devem ser anexadas ao pedido. O procedimento tem como objectivo combater os atrasos nos processos.
Só pagando é que os pequenos furtos chegam a tribunal
Histórias como a de um sem-abrigo julgado por furtar uma embalagem de polvo no supermercado, um sabonete e um champô podem desaparecer das páginas dos jornais. Para que os pequenos furtos em estabelecimentos comerciais cheguem a julgamento, os lesados terão de apresentar acusação a nível particular, pagando as custas judiciais inerentes ao processo. Será portanto o supermercado a pagar, ao contrário do que acontecia antes, quando o MP tinha de tomar a iniciativa. O crime passa a depender de acusação particular só nos casos em que os objectos furtados estejam visíveis ao público e o comerciante consiga recuperar os artigos ou reparar o prejuízo. Ou seja, se o ladrão conseguir fugir com o sabonete esta regra já não se aplica. E o mesmo acontece se o furto ocorrer fora do “período normal de funcionamento”. Nos casos em que o furto for cometido por “duas ou mais pessoas”, “numa comunhão de esforços”, o crime continua a ter natureza semipública: basta que o ofendido apresente queixa. Aí não paga as custas.
Condutores alcoolizados no banco dos réus
Seja um novato seja um veterano das estradas, se for apanhado a conduzir com excesso de álcool
terá de enfrentar obrigatoriamente um julgamento. É proibida a suspensão provisória em qualquer caso. O ex--procurador Pinto Monteiro andou a dizer que a punição de condutores alcoolizados sem julgamento estava a ser “um sucesso”. Mas o governo mudou de ideias: por exigências de prevenção da reincidência, “sempre que o crime seja punível com pena acessória de proibição de condução de veículos com motor”, é obrigatório o arguido ser julgado.
Jura dizer a verdade perante o senhor notário?
“Jura dizer a verdade sob pena de estar a cometer
o crime de falsas declarações?” Estamos habituados pelas séries televisivas a que esta pergunta seja feita por um juiz. Agora esse compromisso não é só válido perante os tribunais. Sempre que, por exemplo, concorrer a um concurso público ou assinar uma declaração num notariado ou nas Finanças, terá de se lembrar desta pergunta em particular. As falsas declarações prestadas a entidades públicas passam a ser punidas com multas ou prisão até um ano.
Se os depoimentos estiverem estampados preto no branco, as consequências são ainda mais pesadas: a pena será agravada até dois anos de prisão sempre que essas declarações sejam usadas num documento oficial.
in ionline | 19-01-2013 | Silvia Caneco